O Direito da Saúde é um ramo que envolve uma série de especialidades. Como médico, você não precisa dominar todas elas; mas se você usa estratégias de marketing digital, precisa conhecer pelo menos as normas que se aplicam a isso.
Nesse artigo, vamos falar sobre os principais desafios enfrentados por médicos e profissionais de marketing médico, e como o Conselho Federal de Medicina se posiciona quanto a esses desafios.
O que é o Direito da Saúde?
O Direito da Saúde não é um ramo jurídico delimitado por leis e especificidades processuais próprios (como o Direito Civil, Penal, ou do Trabalho, por exemplo). Mas na prática, convencionou-se chamar de Direito de Saúde o conjunto de normas aplicáveis às profissões e relações entre profissionais e pacientes na área da saúde. Essas leis envolvem:
- a Lei do SUS;
- a Lei dos Planos de Saúde;
- Códigos de Ética dos Conselhos de Classe;
- entre outras leis e atos normativos editados pelo Ministério da Saúde, pelos Conselhos de Classe e outros órgãos relacionados.
Além dessas leis específicas, o especialista em Direito da Saúde também analisa questões referentes à responsabilidade civil médica, Direito do Consumidor, normas de publicidade, leis de seguridade social aplicáveis a benefícios relacionados à saúde… e muito mais.
Mas calma! A menos que você também seja advogado, como médico você não precisa ter conhecimento sobre todas essas matérias e normas. Para isso, existem os advogados especializados.
Porém, se você gere sozinho a sua presença digital e estratégias de marketing, ou se participa delas de alguma forma, é importante ter uma noção das regras de publicidade que se aplicam à sua profissão. Afinal, algo aparentemente tão inofensivo e usual como fazer um post em uma rede social pode acabar te fazendo incidir em alguma infração.
Quais são os principais desafios do Direito da Saúde no marketing médico digital?
O marketing médico digital precisa seguir as diretrizes de publicidade médica do CFM, que não têm uma natureza estratégica, mas sim, ético-normativa. Ou seja, em termos práticos: o CFM não te diz o que você tem que fazer para ter bons resultados com marketing. Ele te diz o que você pode ou não fazer para não prejudicar a classe, para estar em conformidade com os princípios do Conselho, e consequentemente, para evitar infrações.
Nesse sentido, os principais desafios éticos e legais que médicos e profissionais de marketing médico enfrentam são relacionados a:
Sigilo profissional e exposição de pacientes
Divulgar pacientes ou casos da sua clínica pode até ser uma forma de demonstrar ao público os resultados do seu trabalho e mostrar que você tem demanda; mas são procedimentos que necessitam extremo cuidado.
O Código de Ética Médica determina que é proibido “fazer referência a casos clínicos identificáveis, exibir pacientes ou seus retratos em anúncios profissionais ou na divulgação de assuntos médicos, em meios de comunicação em geral, mesmo com autorização do paciente” (artigo 75).
Essa é, sem dúvidas, uma das questões mais delicadas no marketing médico digital, já que expor casos práticos e marcar o perfil dos pacientes nas redes sociais estão entre as práticas de marketing mais desejadas por muitos médicos.
Muitos acreditam que ter o consentimento do paciente é suficiente para poder expô-lo em uma foto ou vídeo na rede social profissional. Mas você sabia que há casos em que nem mesmo o consentimento permitiria a exposição da imagem do paciente?
O artigo 11, VIII, da da Resolução nº 2.336/2023, determina que é proibido “expor imagens de consultas e procedimentos transmitidas em tempo real, com técnicas ou métodos de abordagens, ainda que com autorização expressa do paciente” (os grifos não constam da redação original). Mas há exceções a essa regra, como “a captura de imagens por equipes externas de filmagem, durante a realização de procedimentos, fica autorizada apenas para partos, quando a parturiente e/ou familiares assim desejarem e houver anuência do médico” (artigo 14, II, d).
Sensacionalismo e autopromoção
Qual é o limite entre o marketing e divulgação saudáveis e a autopromoção exagerada? É difícil encontrar esse equilíbrio, para evitar incorrer na proibição de “portar-se de forma sensacionalista ou autopromocional” que consta no artigo 11, XVI, da Resolução nº 2.336/2023. Porém, a própria Resolução traça esses limites, no segundo e terceiro parágrafos do artigo 11:
- 2º Entende-se porsensacionalismo:
- a) divulgarprocedimento com o objetivo de enaltecer e priorizarsua atuação como médico ou do local onde atua;
- b) utilizarveículos e canais de comunicação para divulgarabordagem clínica e/ou terapêutica médica que ainda não tenha reconhecimento pelo CFM;
- c) adulterar e/ou manipular dado estatístico e científico para se beneficiarindividualmenteou à instituição que integra, representa ou o financia;
- d) apresentarempúblico técnica, abordagem ou método científico que deva ser limitado ao ambiente médico, inclusive a execução de procedimentos clínicos ou cirúrgicos;
- e) veicularempúblico informação que possa causar intranquilidade, insegurança, pânico ou medo de forma coletiva ou individual, mesmo que para fatos conhecidos;
- f) usar de forma abusiva, enganosaousedutora representações visuais e informações que induzam à percepção de garantia de resultados.
- 3º Entende-se porpromocionalreferir–se a si próprio, a serviço onde atue ou a técnicas e procedimentos de modo a conferir-se propriedades e qualidades privilegiadas.
Conteúdo informativo x consultas online
O marketing de conteúdo é uma das ações mais eficazes e sustentáveis no médio e longo prazo, pois constrói marca, credibilidade e autoridade aos pouquinhos, entregando informação e conteúdo relevante para atrair os pacientes mais adequados para você.
Mas é preciso tomar muito cuidado com a forma como esse conteúdo é entregue.
Embora seja permitido ao médico realizar consultas online, é preciso estabelecer um limite entre tirar uma dúvida de um seguidor ou lead (como uma forma de entregar conteúdo) e avaliar um caso que mereça uma verdadeira consulta médica!
O artigo 8º, § 2º, da Resolução nº 2.336/2023, define muito bem qual é a finalidade que o marketing de conteúdo tem (embora não se refira expressamente a essa forma de fazer marketing): “Nas redes próprias, a publicidade/propaganda poderá ter o objetivo de formação, manutenção ou ampliação de clientela, bem como dar conhecimento de informações para a sociedade” (os grifos não constam da redação original). Perceba como a lei se refere à informação de forma mais ampla e genérica, inclusive mencionando que ela é direcionada à sociedade. Ou seja: qualquer caso que mereça uma análise individual deve ser objeto de uma consulta médica, não de um comentário ou post em rede social!
Além disso, é importante destacar também o que diz o artigo 10 da Resolução nº 2.336/2023: “Ao conceder entrevistas a qualquer veículo ou canal de comunicação, bem como na publicação de artigos e informações ao público leigo, o médico deve se portar como representante da medicina, devendo abster-se de condutas que visem angariar clientela ou pleitear exclusividade de métodos diagnósticos e terapêuticos.”
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Alexandre de Souza Teixeira
Head – Sócio Fundador da IN COMPANY e especialista em marketing médico e saúde em geral.
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